EXCELENTÍSSIMO SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA Xª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE “CIDADE”-“ESTADO”
PROC. XXXXXXXXXXXX
NOME DO(A) ACUSADO(A), por seu ADVOGADO DATIVO (fl. X), na ação penal promovida pelo Ministério Público, que alega a consumação de crime de falsidade ideológica, previsto no art. 299, caput, do Código Penal, especificamente sobre o despacho de fl. X, vem perante Vossa Excelência oferecer sua resposta escrita nos termos do art. 396 e art. 396-A, ambos do Código de Processo Penal, em vigor depois de sua vacância legislativa ex vi do art. 2° da Lei 11.719, de 20 de junho de 2008.
PRELIMINARMENTE, requeiro a contagem em dobro de todos os atos processuais subseqüentes diante da redação expressa do § 5° do art. 5° da Lei 1.060, de 5.2.1950 (acrescentado pela Lei 7.871/89), que não foi derrogada pela Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006, seja com fundamento subsidiário no § 1° do art. 2° do Decreto-Lei 4.657, de 4 de setembro de 1942 (LICC), no art. 9° da Lei Complementar 95, de 26 de fevereiro de 1998 - na redação determinada pela Lei Complementar 107, de 26 de abril de 2001 -, ou, ainda, com fundamento no § 4° do art. 370 do CPP, mantendo-se incólume, portanto, a prerrogativa da intimação pessoal bem como da contagem em dobro de todos os prazos, principalmente pela locução “ou quem exerça cargo equivalente”, equiparando o citado § 5° do art. 5° da Lei 1.060 a função exercida pelo advogado dativo ao cargo de Defensor Público nos estritos conceitos de Direito Administrativo, sem distinção dos profissionais que atuam na lide e sendo irrelevante, para efeitos processuais, a origem institucional que ostentam sob o risco de ser ferido o princípio da igualdade previsto no art. 5°, caput, da Constituição da República Federativa do Brasil.
Admitindo a intimação pessoal e o prazo em dobro em todos os atos processuais ao defensor dativo:
TJSP, Câm. Esp., Ag 32488-0, rel. Des. Dirceu de Mello, j. 8.8.1996; 2.° TACivSP, Ap 353228, rel. Narciso Orlandi, j. 4.6.1992, BolAASP 1769/5, supl. E, ainda, o d. juízo da Xª Vara Criminal da Comarca de “CIDADE”, Proc. XXXXXXXXXXXX.
PRELIMINARMENTE, ainda, observo que houve diligências do Oficial de Justiça no sentido de citar a acusada “dos termos da denúncia” (fl. X), após a entrada em vigor da Lei 11.719, sem êxito até o presente momento (fl. X, verso, e fl. X, verso). Com efeito, o art. 363 do Código de Processo Penal, segundo a nova disposição, exige que o processo, para ter completada a sua formação, necessita da citação do acusado, como não poderia deixar de ser, certamente. Ocorre que o art. 362 do mesmo CPP inovou a ordem jurídica ao prever nova modalidade de citação, conhecida como “citação com hora certa”, remetendo o intérprete aos arts. 227 a 229 do Código de Processo Civil (art. 3° do CPP). Deste modo, visando dar regularidade ao procedimento, à luz da legalidade extrema – ampla defesa - prevista no inc. LV do art. 5° da Constituição, requeiro a citação com hora certa da acusada, depois do 3° ato citatório a ser realizado pela Serventia, pois constatei a existência de dois atos neste sentido (fl. X e fl. X, cit.). Não sendo encontrada, e sem que se possa saber, ao certo, seu domicílio, para efeitos do § 1° do art. 228 do CPC (parágrafo único do art. 362, cit.), requeiro a citação por edital da acusada segundo o § 1° do art. 363 do Código de Processo Penal, lembrando que o art. 366 do mesmo Código foi objeto de veto no caput, revogados seus §§ 1° e 2° (art. 3° da Lei 11.719), mantendo-se, pois, a disposição vigente determinada pela Lei 9.271, de 17 de abril de 1996. Entretanto, comparecendo a acusada depois de citada por edital, em qualquer tempo, requeiro a observância do disposto nos arts. 394 e seguintes do Código de Processo Penal, por força do § 4° do art. 363 do CPP na redação da Lei 11.719. Aliás, sobre a inadmissibilidade da suspensão do procedimento nas hipóteses do art. 366 do CPP, já decidiu o Supremo Tribunal Federal:
“Impossibilidade de se aplicar a suspensão do processo, quando se tratar de réu revel, conforme previsto no art. 366, com a redação da Lei 9.271/96, deixando de aplicar a regra da suspensão do curso do prazo prescricional, também prevista no mesmo dispositivo legal. HC indeferido” (HC 74.695-1-SP – DJU de 9-5-97, p. 18.130).
No mesmo sentido, defendendo a continuidade do procedimento nas hipóteses de citação por edital, atribuindo a “inexistência de revelia” diante de defesa técnica nos autos, mesmo que ad hoc, GUILHERME DE SOUZA NUCCI:
“Enfim, o que ocorre na esfera penal é a simples ausência do processo, conseqüência natural do direito de audiência. O réu pode acompanhar a instrução pessoalmente, mas não é obrigado a tal. Estando presente seu defensor, o que é absolutamente indispensável, ainda que ad hoc, não pode ser considerado revel (aquele que não compareceu nem se fez representar)” (MANUAL DE PROCESSO PENAL E EXECUÇÃO PENAL. RT: SP, 2006, pp. 609/610).
Realmente, a suspensão do procedimento, bem como a suspensão do curso do prazo prescricional (art. 366 do CPP), principalmente em virtude do extenso prazo prescricional relativamente à declaração de extinção da punibilidade ex vi do inc. IV do art. 107 combinado com o inc. III do art. 109, ambos do Código Penal, conforme entendimento majoritário da doutrina e dos tribunais (NUCCI, ob. cit., p. 607 e RT 754/575), acarretar-lhe-á prejuízo, de fato, pois haverá grave insegurança jurídica e violação à razoável duração do processo (art. 5°, caput, combinado com o inc. LXXVIII, da Constituição), motivo pelo qual requeiro a continuidade do procedimento mesmo depois da citação por edital da acusada.
PRELIMINARMENTE, ainda, observo que o crime imputado à acusada é daqueles que necessariamente deixam vestígios, sendo indispensável, destarte, a realização de exame de corpo de delito (art. 158 e inc. I do § 5° do art. 159, ambos do CPP, sendo este último dispositivo determinado pela redação da Lei 11.690, de 9 de junho de 2008), pois sem isso não há, sob a luz do contraditório judicial, materialidade do crime tido por consumado, e, portanto, passível de ser absolvida a acusada nos termos do inc. II – ou subsidiariamente o inc. IV na redação determinada pela Lei 11.690, cit. - do art. 386 do Código de Processo Penal. Requeiro, assim, a realização de prova pericial, produzida em juízo, dos documentos mencionados pelo Ministério Público na denúncia (fls. X/X) ex vi do art. 155, caput, do Código de Processo Penal na redação determinada pela Lei 11.690, cit., sob pena de nulidade absoluta conforme disposição expressa da alínea b do inc. III do art. 564 do Código de Processo Penal.
NO MÉRITO, requeiro a absolvição sumária da acusada diante da nova previsão do art. 397 do Código de Processo Penal, na redação determinada pela Lei 11.719, cit., pois houve erro sobre elementos constitutivos do tipo penal, conforme o art. 20, caput, do Código Penal, cujo fundamento, principalmente pelas divergências doutrinárias com relação às causas de seu reconhecimento, excluindo o crime por ausência de tipicidade, ilicitude ou culpabilidade, dependendo da corrente adotada pelo intérprete, não desmerece o brocardo latino de que “o juiz conhece o Direito”.
O art. 20 do Código Penal prescreve que o erro sobre elemento constitutivo do tipo penal de crime exclui o dolo, mas permite a punição por crime culposo, se previsto em lei, não sendo o caso, todavia, do crime previsto no art. 299, caput, do Código Penal, que não admite a modalidade culposa, impondo-se, imperiosamente, a absolvição da acusada. Neste sentido, as lições do Mestre PAULO JOSÉ DA COSTA JR., para quem
“Ignorar é não saber; errar é saber mal. A ignorância configura um estado negativo: a ausência total de qualquer conhecimento. O erro é um estado positivo: o agente conhece, mas de forma errônea. O erro, quer apresentado como falso conhecimento (erro propriamente dito), quer como ausência de conhecimento (ignorância), anula o elemento intelectivo de dolo (previsão ou representação do resultado), ou o elemento normativo (consciência do caráter proibitivo da ação ou da omissão). Por isso, costuma-se dizer que o erro é o avesso do dolo. [...] A teoria finalista da ação esvazia a culpabilidade, deslocando o dolo para o tipo penal. A potencial consciência da ilicitude permanece na culpabilidade, ao lado da imputabilidade e da exigibilidade da conduta conforme o dever (adequada à norma). O dolo representa um elemento constitutivo do fato típico. A vontade criminosa assume relevância não enquanto tal, mas enquanto se traduz em realização. O conteúdo do dolo determina a direção lesiva da ação, contribuindo para iluminar o perfil da culpabilidade. Exemplificam Fiandaca-Musco: uma declaração não verdadeira pode constituir uma mentira inócua, um estelionato, ou uma difamação, conforme a intenção que ilumina aquele que age. O agente, em verdade, poderá visar ao comprometimento da reputação alheia, à provocação de um dano patrimonial, ou a uma simples ‘gozação’. A função restante do dolo, no processo de imputação penal, segundo Fiandaca-Musco, é cunhar a forma mais grave da culpabilidade: quem age com dolo agride o bem tutelado de modo mais intenso do que quem age com culpa. A maior carga agressiva é percebida não só pela vítima, mas também pela coletividade, que, sentindo-se mais ameaçada, reprova mais gravemente as lesões provocadas de maneira intencional. [...] O erro de tipo (Tatbestandsirrtum) pode decorrer de equivocada percepção dos fatos, como de falsa compreensão do direito. Como se vê, o erro de tipo, embora coincida em parte com o erro de fato, o supera. Enquanto o erro de fato recai apenas sobre circunstâncias fáticas do crime (subtrair coisa alheia, imaginando-a própria), o erro de tipo poderá incidir tanto sobre as mencionadas circunstâncias como sobre elementos de natureza normativa (invadir um escritório, acreditando erroneamente que o local de atividade profissional não está abrangido no conceito jurídico-penal de casa). O erro de tipo, desde que recaia sobre um de seus elementos constitutivos, exclui o dolo. A conduta negligente de sujeito-agente poderá ser punida, desde que prevista em lei a modalidade culposa. Bastaria que o legislador houvesse dito no art. 20: ‘O erro sobre elemento constitutivo do tipo legal de crime exclui o dolo, mas permite a punição por crime culposo’. Despicienda a referência de que a punição por crime culposo se fará, se previsto em lei, diante dos termos do art. 18, parágrafo único. Asúa sintetiza: no erro de tipo, o agente não sabe o que faz. No erro de proibição, não sabe que ‘su hecho es antijurídico, o cree que está exculpado’” (Direito Penal Objetivo. Forense Universitária: RJ/SP, 2003, pp. 56/57)
Ainda que Vossa Excelência divirja do entendimento do dileto doutrinador sobre a causa da absolvição sumária, mister consignar que todas elas foram previstas pelo legislador no vigente art. 397 do Código de Processo Penal (incisos I, II e III), na redação determinada pela Lei 11.719, cit., excluindo-se em sentido lato, de qualquer modo, o crime em tela.
Houve erro sobre elemento constitutivo do tipo legal com relação ao crime previsto no art. 299, caput, do Código Penal. É inadmissível crer que a acusada fez requerimento de nova identidade (RG) perante órgão do Estado, requerendo, em outra oportunidade a segunda via do mesmo documento, na intenção de fazer inserir, em documento público, declaração falsa e diversa da que devia ser escrita, com o fim de alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante, conforme descreveu a denúncia ao lhe imputar conduta manifestamente dolosa, da qual não se prescinde o elemento subjetivo do tipo (fls. X/X). Outros fatores, ao contrário, podem diagnosticar a conduta da acusada, à primeira vista capitulada como crime, tal como, exemplificativamente, inimputabilidade por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, ao tempo da ação, sendo incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento, ou mesmo embriaguez completa proveniente de caso fortuito ou força maior, ao tempo da ação, tornando-a incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento, da mesma forma, ou, ainda, a circunstância de embriaguez patológica vulgarmente conhecida como alcoolismo, excluindo-se sua responsabilização penal nos termos da denúncia (art. 26, caput, combinado com o § 1° do art. 28, ambos do Código Penal). Além disso, o crime de falsidade ideológica (art. 299, caput, do CP) não admite a modalidade culposa, impondo-se sua absolvição com fundamento no princípio da legalidade previsto no art. 1° do Código Penal, recepcionado pelo inc. XXXIX do art. 5° da Constituição, e, ainda, pela complementaridade da norma prevista no parágrafo único do art. 18 do Código Penal.
Subsidiariamente, apenas por hipótese, caso Vossa Excelência entenda de forma diversa, requeiro o reconhecimento do crime em sua forma tentada, diminuindo-se sua pena em dois terços ex vi do parágrafo único do art. 14 do Código Penal, pelo fato do reduzido perigo a que foi exposto o bem jurídico tutelado (teoria objetiva adotada pelo Código Penal. CEZAR ROBERTO BITENCOURT. CÓDIGO PENAL COMENTADO. Saraiva: SP, 2005, p. 46), não chegando a iludir terceiros de boa-fé em virtude de o crime imputado ter ocorrido dentro de órgão do Estado, não exaurindo de forma acentuada os efeitos comumente suportados em crimes contra a fé pública.
A propósito, MIGUEL REALE JÚNIOR, sobre a pena na tentativa, diz que
“Esta individualização não se confunde com a prevista no art. 59 do Código Penal, visando à fixação da pena-base, mas deve cingir-se ao fato tentado, como causa de diminuição de pena a incidir sobre a pena-base. Desse modo, a fixação da pena pode levar em conta as conseqüências da ação, o grau de perigo a que foi submetido o bem jurídico, e se na realização da ação o agente fez uso de todos os meios falhando assim mesmo a consumação do crime, ou se o processo executório foi logo interrompido, com menor risco para o bem jurídico” (INSTITUIÇÕES DE DIREITO PENAL. PARTE GERAL, Vol. I. Forense: RJ, 2004, p. 294).
A denúncia, ademais, descreve que a conduta da acusada foi a de “fazer inserir” (fl. X), configurando-se, destarte, a permissibilidade em sua redução pelo máximo permitido quanto à causa de diminuição legal da pena, pela tentativa (art. 14, cit.). Admitindo a possibilidade de tentativa em crime de falsidade ideológica, LUIZ REGIS PRADO:
“A tentativa, na forma omissiva e na comissiva de inserir (falsidade imediata), é inadmissível. Só é possível na modalidade comissiva fazer inserir” (DIREITO PENAL, vol. 4. RT: SP, 2008, p. 35).
Por último, sobrevindo eventual sentença condenatória, nos termos da denúncia, requeiro a aplicação da pena em seu mínimo legal, seja com relação à pena privativa da liberdade (art. 59 do CP), seja com relação à pena de multa cumulativamente aplicada ao crime, constatada a miserabilidade econômica da acusada (art. 49 combinado com o art. 60, caput, ambos do CP), principalmente para efeitos de substituição da pena ex vi do art. 44 do Código Penal.
Cidade, dia, mês e ano.
Advogado dativo
OAB XXXXXX
Advogado, pós-graduado em Direito Processual Civil e Pós-Graduando em Direito Processual Constitucional, na Universidade Católica de Santos/SP
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: DINAMARCO, Tassus. Aplicação prática das Leis 11.690 e 11.719, ambas de 2008, derrogadoras do CPP Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 27 dez 2008, 08:59. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Peças Jurídicas/16292/aplicacao-pratica-das-leis-11-690-e-11-719-ambas-de-2008-derrogadoras-do-cpp. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Conteúdo Jurídico
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